quarta-feira, 3 de junho de 2009

Ata 4 - Bakhtin

Ata da aula ministrada no dia 13/05/2009, pela professora Ludmila Thomé de Andrade.

Por Priscila Lutz.

A aula relatada a seguir teve início as 14 horas e 30 minutos do dia 13 de maio de 2009. Num primeiro momento, fez-se uma breve retrospectiva da aula anterior com o intuito de fixar alguns conceitos básicos do pensamento de Mikhail Bakhtin. Assim, Ludmila T. de Andrade, retornou às primeiras páginas do Livro estudado, Marxismo e Filosofia da Linguagem, onde o autor apresenta sua ideias sobre a função de representação da linguagem, o conceito de signo e de semiótica. Para Bakhtin “tudo o que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia” (Bakhtin, 2004, p.31).
A seguir abordou-se o tema linguagem verbal e não verbal. A filogênese humana é marcada por muitas formas de linguagens não verbais, já que é comprovada a comunicação humana antes do desenvolvimento da fala, indicativo da existência de outros sistemas de signos que davam conta de refletir e refratar a realidade. Segundo o pensamento de Bakhtin o homem é um ser significante, responsável por atribuir significado as coisas e por criar sistemas semióticos de representação. Nas palavras do próprio autor “... todo corpo físico pode ser percebido como simbolo (...) Converte-se, assim, em signo o objeto físico, o qual, sem deixar de fazer parte da realidade material, passa a refletir e a refratar, num certa medida, uma outra realidade” (Bakhtin, 2004, p. 31)
Dessa forma, o sistema de representação humano para Bakhtin o tempo todo reflete e refrata a realidade exterior. Segundo essa ideologia, refletir significa reproduzir e refratar seria reproduzir, alterando o roteiro da comunicação. Portanto, para o linguista, “um signo não existe apenas como parte de uma realidade; ele também reflete e refrata uma outra. Ele pode distorcer essa realidade, ser-lhe fiel, ou apreendê-la de um ponto de vista específico, etc.” (Bakhtin, 2004, p. 32). Para uma melhor fixação desses conceitos, a professora construiu um pequeno gráfico que tentaremos reproduzir o mais fidedignamente possível, a fim de refletir sem muita refração os conteúdos ministrados.

REPRESENTAÇÃO


Grupo 1
REFERENCIAL
REFLETE

REPRODUZ

Grupo 2
DÊITICA
REFRATA


CONTEXTUALIZA



Assim, enquanto o primeiro grupo representa o sistema lógico, o segundo representa a interlocução, enquanto no primeiro grupo o objeto e o conteúdo do tema é trazido de uma maneira inteira, no segundo, há a cena enunciativa e as relações interpessoais que se passam num determinado momento político, histórico, ou seja, num plano ideológico. Enquanto o primeiro grupo representa o lugar da inscrição, o segundo representa o lugar da ação, da criação.
Segundo a professora, indissociavelmente nessa representação, teremos um outro aspecto, uma outra dimensão abordada por Bakhtin que é a função dêitica[1] [2] da linguagem. Ludmila, então, segue exemplificando: a diretora da faculdade de educação quer escrever uma carta para pedir um determinado material, provavelmente, ela utilizará um modelo pronto que pegará em seu computador, onde somente mudará a data e a assinatura. O modelo da carta representa o grupo 1 e as modificações realizadas pela diretora estão inseridas no grupo 2. Dessa forma, os elementos deiticos seriam os responsáveis por situar o tempo e a pessoa do discurso, viabilizando o processo de comunicação na medida que serve como instrumento de identificação do sujeito significante e refração da realidade, enquadrando, assim, o enunciado, em um determinado momento histórico.
Mas, se a linguagem para Bakhtin encontra-se situada prioritariamente no segundo grupo, há correntes linguísticas opostas, vertentes de estudiosos que acreditam na linguagem lógica, no objetivismo abstrato, na possibilidade de uma referencialidade perfeita, onde a gramática, a sintaxe, a morfologia, etc, seriam elementos capazes de explicar a realidade e como numa fórmula matemática, representar precisamente as leis da natureza. Para Bakhtin, essa linguagem estritamente lógica não seria possível e essa referencialidade perfeita estaria morta, pois não trazendo consigo o momento (tempo), ela não necessitaria ser comunicada. Assim, segundo o autor “ignorar a especificidade do material semiótico-ideológico, é reduzir o fenômeno ideológico, é tomar em consideração e explicar apenas seu valor denotativo racional...” (Bakhtin, 2004, p.40). Adiante, Ludmila cita o exemplo do instrumento foice, que em determinado momento histórico do mundo ocidental virou símbolo de fortíssima significação dos ideais comunistas.
Outro autor levantado nessa aula foi o sociólogo francês Pierre Bourdieu, na tímida tentativa de aproximar suas ideias com as de Mikhail Bakhtin. Bourdieu trouxe em sua obra a noção de subdivisão (campo) social[3] e criou uma teoria estruturalista, onde as relações de poder existentes dentro de determinado sistema social seriam as responsáveis pela organização do mesmo. Outro conceito de Bourdieu levantado pela professora é o conceito de acumulação de capital. Para esse autor, em um sistema estruturalista, seus membros ascendem socialmente na medida que acumulam capital (dinheiro, estatus,etc). Dessa forma, para ele, a organização social seria pautada por critérios acumulativos de classificação. Por exemplo, para Bourdieu, numa sociedade capitalista, um político teria mais prestígio que um professor universitário, que por sua vez, teria mais prestígio que um professor do ensino médio e assim por diante. Portanto, o pensamento de Bourdieur encontra-se com o de Bakhtin na crença da indissociabilidade entre inscrição e ação. Ou seja, para ambos os autores, a realidade só existe e pode ser totalmente compreendida na análise das relações interpessoais.
Em seguida, Ludmila retornou a página 37 do livro estudado para uma explicação mais pormenorizada do conceito de palavra Bakhtiniano. Segundo ela, Bakhtin, ao se referir à palavra como signo por excelência, o faz metaforicamente. É do sistema semiótico verbal que ele esta falando, já que na obra do autor a unidade verdadeira de sentido é o enunciado.
Outro conceito abordado por Bakhtin e trazido à aula foi o da ubiquidade da palavra. Vimos que apesar de existirem sistemas semióticos não verbais, muitas vezes, eles necessitam do sistema verbal para se apoiarem. Por exemplo, ao olharmos um quadro ou escutarmos uma música, sempre acabamos usando o verbal para traduzir nossos sentimentos. Assim, para esse linguista, o verbal acompanha e comenta todo ato ideológico, segundo Ludmila, você não traz esse objeto apenas, esse objeto vem entoado, ela deu como exemplo o palavrão ou a própria prosódia. Portanto, nas palavras do autor:

“É impossível, em última análise, exprimir em palavras, de modo adequado, uma composição musical ou uma representação pictórica (...) embora nenhum desses signos ideológicos seja substituível por palavras, cada um deles, ao mesmo tempo, se apóia nas palavras e é acompanhado por elas, exatamente como no caso do canto e de seu acompanhamento musical” (Bakhtin, 2004, p.38)

É interessante também observar o modo do autor elaborar seus textos, Bakhtin fala por meio de nãos e sempre dialeticamente, sempre em consonância com seu momento histórico traz o que já existe, o que estudou, o que conhece, afirmando e negando a informação o tempo todo, até, finalmente, expor seu posicionamento, ou não.
Adiante, Ludmila aborda a discussão sobre obra literária, lê o primeiro parágrafo da página 40 do livro estudado, onde Bakhtin cita a obra de Rúdin, O Homem Supérfluo. Lembra que Walter Benjamim no texto O Narrador, ataca o gênero literário romance ao dizer que ele é burguês, em sua arquitetura, em sua estrutura. A professora recorda que esse gênero literário espelha bem uma geração historicamente identificada com o mesmo e por esse motivo ele parece ter sido tão evocado nos escritos de ambos autores marxistas.
Falou-se também, sobre os dois ângulos distintos que Bakhtin utilizou ao abordar tal assunto. Um enfoca seu caráter macro (superestrutura) e para o leitor, quando o romance retrata bem uma certa geração, o romance é bom. O romance é visto aqui como representante de uma determinada realidade social. O segundo enfoque seria o micro (infraestrutura), técnico, ou seja, textual, linguístico, estilístico, etc.
Logo a seguir, explicou-se um pouco o conceito de psicologia do corpo social presente nas páginas 42 e 43, para Bakhtin “A psicologia do corpo social não se situa em nenhum lugar “interior” (...) ela é, pelo contrário, inteiramente exteriorizada: na palavra, no gesto, no ato (...) . Trata-se, muito precisamente, das próprias formas de concretização deste espírito, isto é, das formas da comunicação no contexto da vida e atrás de signos.” (Bakhtin, 2004, p.42-43)
A aluna Beth, então, pede a palavra e discursa brevemente sobre o tema inscrição e ação, segundo ela, as posições são os grupos sociais, já a inscrição é um gesto. A posição esta sempre lá e vc apenas se inscreve nela.
Voltou-se então à discussão sobre corpo social. Segue abaixo o resumo de algumas ideias sobre o assunto:

· Não há indivíduo sem o social;
· Tudo o que somos interiormente esta representando o exterior;
· Não há separação entre interior e exterior;
· Você só pensa que você é você por que tem a experiência do social.

Finalizou-se o segundo capítulo do livro lendo um pequeno resumo feito pelo próprio Bakhtin, que se encontra da metade para o final da página 46. A aluna Rosita ainda destacou o conceito de signos defuntos abordado pelo autor, já que para ele “(..) é este entrecruzamento dos índices de valor que torna o signo vivo e móvel, capaz de evoluir. O signo, se subtraído às tensões da luta social, se posto à margem da luta de classes, irá infalivelmente debilitar-se, degenerará em alegoria (...)” (Bakhtin, 2004, p.46). Ou seja, tornar-se-á um signo defunto.
Após o intervalo, dividiu-se a turma em dois grupos. O grupo um ficou incumbido de defender, após pequeno estudo, o tema, subjetivismo idealista, presentes nas pgs. 72 a 77 do livro estudado. O grupo dois ficou incumbido de defender o tema objetivismo abstrato, presentes nas pgs. 77 a 81. Isso por que o subjetivismo idealista e o objetivismo abstrato são duas tendências opostas, conforme veremos a seguir.
Para o subjetivismo idealista a essência da língua está inscrita em sua história, sua fonte é o psiquismo individual. Essa tendência defende que “a língua é uma atividade, um processo criativo ininterrupto de construção (“energia”) que se materializa sob a forma de atos individuais de fala.” (Bakhtin, 2004, p.72). Já para o objetivismo abstrato a língua é imutável, para os defensores dessa corrente, a língua seria como uma equação matemática, não há meio termo, ou é certo ou é errado. Assim, nas palavras do próprio autor “segundo esta tendência, o centro organizador de todos os fatos da língua, o que faz dela o objeto de uma ciência bem definida, situa-se, ao contrário, no sistema lingüístico, a saber o sistema das formas fonéticas, gramaticais e lexicais da língua.” (Bakhtin, 2004, p. 77). Finalmente, a aula terminou as dezessete horas do dia treze de maio de dois mil e nove. Em um primeiro momento, fez-se um estudo mais aprofundado de conceitos essenciais, presentes nos capítulos um e dois da obra estudada, o livro Marxismo e Filosofia da Linguage. A seguir, passou-se ao estudo do capítulo quatro do referido livro e por meio de um pequeno seminário expusemos as duas correntes linguísticas abordadas pelo autor. Espero portanto, que tenha conseguido alcançar o objetivo desta ata e transmitido, nestas quatro páginas, os principais conteúdos ministrados pela professora.

[1] Conforme explicação do prof. Rodolfo Ilari/Unicamp, em seu livro “Introdução à semântica: brincando com a gramática”, chamamos de dêiticas as expressões que se interpretam por referência a elementos do contexto extra-lingüístico em que ocorre a fala. A dêixis diz respeito principalmente às pessoas que participam da interação verbal, ou a lugares e tempos que são localizados a partir da situação de fala. Ela realiza uma espécie de “ancoragem” da fala na realidade. Ocorre sobretudo por meio dos pronomes, dos artigos, dos tempos dos verbos e de certos advérbios. (site: http://aescritanasentrelinhas.d3estudio.com.br/?p=311, acesso em 17/05/2009)

[2] Ludmila cita Benveniste, primeiro linguista a produzir estudos relevantes sobre enunciação.



[3] Campo social é definido por Ludmila, como um grupo de pessoas mobiblizadas pelos mesmos interesses.

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